sábado, 2 de maio de 2020

TRIGONOMETRIA AMOROSA


A folhas tantas do livro de Matemática
um Quociente apaixonou-se
um dia
doidamente
por uma Incógnita.
Olhou-a com seu olhar inumerável
e viu-a, do Ápice à Base...
uma Figura Ímpar;
olhos rombóides, boca trapezóide,
corpo ortogonal, seios esferóides.
Fez da sua
uma vida
paralela à dela
até que se encontraram
no Infinito
"quem és tu?" indagou ele
com ânsia radical
"sou a soma do quadrado dos catetos
mas pode chamar-me Hipotenusa."
e falando descobriram que eram
o que, em aritmética, corresponde
a alma irmãs
primos-entre-si.
E assim se amaram
ao quadrado da velocidade da luz
numa sexta potenciação
traçando
ao sabor do momento
e da paixão
eetas, curvas, círculos e linhas sinusoidais.
escandalizaram os ortodoxos
das fórmulas euclidianas
e os exegetas do Universo Finito
romperam convenções newtonianas
e pitagóricas
E, enfim, resolveram casar-se
constituir um lar.
mais que um lar,
uma Perpendicular
convidaram para padrinhos
o Poliedro e a Bissectriz.
e fizeram planos, equações e
diagramas para o futuro
sonhando com uma felicidade
integral
e diferencial
E casaram-se e tiveram
uma secante e três cones
muito engraçadinhos.
E foram felizes
até aquele dia
em que tudo, afinal,
se torna monotonia
foi então que surgiu
o máximo divisor comum...
frequentador de círculos concêntricos
viciosos.
Ofereceu, a ela,
uma grandeza absoluta,
e reduziu-a a um denominador comum.
Ele, quociente, percebeu
que com ela não formava mais um todo,
uma Unidade.
era o Triângulo,
chamado amoroso.
E desse problema, ela era a fracção
mais ordinária
mas foi então que Einstein descobriu a
relatividade
E tudo que era expúrio passou a ser
moralidade
como aliás, em qualquer
sociedade.


Millôr Fernandes.


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