O mistério
As palavras daquela canção explodiram-lhe na cabeça. Algo se
agitou dentro de si, fechou os olhos e lembrou-se dela….onde andaria? Porque
teria partido sem nada dizer? Encostada à porta, sentiu o sonho, ou melhor um pesadelo,
agitar-se dentro de si como um friso de
água surgindo do oceano, avolumando-se numa onda. Nunca iria compreender porque
a sua irmã tinha partido sem uma explicação. Deixou que o seu pensamento
divagasse por entre as recordações que aquela canção arrebatara aos lugares
recônditos da sua memória. Como tinham sido felizes e inseparáveis enquanto
crianças, adolescentes e mais tarde mulheres, por isso não entendia o que se
tinha passado.
Divagando entre os pensamentos, de repente apercebeu-se que canção
acabara e o silêncio profundo tinha-se instalado naquela casa e foi quando lhe
pareceu ouvir um barulho vindo do exterior. Parecia-lhe um gemido, talvez fosse um animal ferido.
Abriu a porta para
ver o que se passava e foi quando
ouviu um choro
de um recém- -nascido.
Deu a volta à casa, e nas traseiras deparou-se com uma alcofa. As pernas tremíam-lhe e aquela
sensação de ansiedade e de temor, fê-la parar, hesitante em avançar.
Mas entretanto decidiu-se. Deparou-se com um bébé
que choramingava, tentou pegar-lhe e o choro transformou-se num sorriso. Um
sorriso que lhe parecia familiar. Pegou na alcofa e levou para dentro de casa,
ainda com as pernas a tremer, parecendo-lhe estar a viver uma cena de um filme.
Não estava a perceber o que estava a acontecer e
foi então que reparou num envelope que estava dentro da alcofa. Uma carta,
reconheceu a letra de imediato.
Começou a lê-la, as mãos trémulas, os olhos a
começarem a embaciar-se, como o horizonte se embacia numa demorada penumbra.
Mas os olhos acordam prostrados e contagiam o resto do corpo.
Tem que se sentar para continuar… começa a
perceber que aquela criança é sua sobrinha, mas a razão de estar ali não
entende…. Continua a leitura, mas com dificuldade, a carta começa a ficar
molhada e as letras a sumirem… Não
percebia bem aquilo que estava a ler. Parecera-lhe profundo, embora essa
profundidade fosse turva e ela nada conseguisse ver nela…
Porque seria que a irmã lhe entregara a filha sem nunca lhe ter
contado nada sobre a sua existência? Elas que sempre foram tão unidas como foi
capaz de lhe esconder uma coisa tão importante? E agora deixá-la com tanta
responsabilidade?
Tinha que concluir a carta para perceber. Finalmente entendeu. A
irmã estava doente, isolou-se, teve aquela filha que agora sabia não poder
educar. Não conseguiu encarar a irmã, mas sabia de antemão que ela não lhe
viraria as costas e que tomaria conta da Carolina.
Os seus sentimentos não precisavam de motivos, nem os desejos de
razão, pensou que tinha que atender o pedido da irmã.
Aliás, esta criança continuaria a ligá-las para sempre!
Maria Dias
Julho 2012
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