A assombração
Ela
nunca tinha recuperado da sua ausência. Mesmo depois de saber que ele nunca
mais voltaria. As noticias finais da sua morte tinham-na deixado prostrada e
mesmo incrédula entregara-se ao luto, sofrendo muito, mas lentamente, como se
nunca mais quisesse acordar para a vida.
Estava
a deslizar para fora do tempo. As delimitações que observava no espaço de uma
vida, perdiam subitamente o significado: segundos, minutos, horas, dias. Meras
palavras, tudo o que queria ter, eram momentos como no passado, e esses já nem
sequer lhe pertenciam.
Tinham
sido tão felizes naquela quinta, naquela casa, aninhada a um canto do prado.
Este estava cercado de bosques de cerejeiras bravas, bordos e carvalhos.
Mergulhada
nos seus pensamentos, ouviu uma rajada de vento que levantou um redomoionho de
folhas secas, que esvoaçaram pelo pátio emitindo um som de uma vassoura de
plumas; algumas delas rasparam ao de leve contra as vidraças. Mas logo acalmou.
O vento deu lugar a uma suave brisa, convidativa a um passeio.
Ela
saiu e ficou a observar o Sol a pôr-se sobre o descampado. Gostava de sguir-lhe
o rasto enquanto deslizava por entre o arvoredo.
O
mundo há anos fechado lá fora, chamava-a de súbito para continuar a caminhar.
Quase
na saída da quinta começou a ficar uma neblina dificultando a visão para a
estrada. Resolveu voltar. Mas quando ía virar algo estranho aconteceu. Pareceu-lhe
ver um vulto, mais parecendo uma assombração.
Deveria
estar alucinada e quis apressar o passo, mas ao mesmo tempo sentia-se
paralisada pela indecisão entre voltar e ficar, sem saber porque estava ali
parada, com as mãos enterradas nos bolsos do casaco.
Tremia
a pensar que não devia ter saído a uma distância tão grande e já ao entardecer.
Mas o vulto aproximava-se lentamente… era um homem que caminhava num andar
lento e trôpego.
Ela
susteve a respiração à espera que ele se aproximasse, que ele falasse, decorreu
um momento longo, durante o qual imaginou tudo menos o que viu e escutou.
-
Laura sou eu. Já não me reconheces?
Mas
ela já tinha desmaiado e foi ele, mesmo fraco, que teve de a amparar para chegarem a casa.
Como
era possível estar a olhar para o Rodrigo, que sabia estar morto e que nunca mais
voltaria daquela maldita comissão.
Mas
era verdade. O Rodrigo não tinha morrido, a carta que recebera há alguns anos
tinha sido um engano.
Ela
ainda estava em choque. E só aos poucos recuperava para a realidade.
Lembrava-se,
em tempos, que lhe dissera que há um ponto em todas as histórias, a partir do qual,
é impossível voltar atrás...Mas desta vez chegou mesmo a um ponto possível de
voltar atrás, e de recuperar a felicidade perdida.
Maria
Dias
Agosto
2012
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